A definição detumblelogs por Jason Kottke, o maior blogueiro da internet, é fantástica (lá de 2005):
A tumblelog is a quick and dirty stream of consciousness, a bit like a remaindered links style linklog but with more than just links. They remind me of an older style of blogging, back when people did sites by hand, before Movable Type made post titles all but mandatory, blog entries turned into short magazine articles, and posts belonged to a conversation distributed throughout the entire blogosphere. Robot Wisdom and Bifurcated Rivets are two older style weblogs that feel very much like these tumblelogs with minimal commentary, little cross-blog chatter, the barest whiff of a finished published work, almost pure editing…really just a way to quickly publish the “stuff” that you run across every day on the web.
Fazia um tempo que eu não escutava Soviet Kitsch, o terceiro álbum da cantora e compositora Regina Spektor. Soviet Kitsch foi um daqueles álbuns que ajudaram a moldar o meu gosto pra música quando eu tinha treze ou quatorze anos.
Eu não sei o que me levou a me afastar desse disco e de Regina Spektor como um todo, mas fazia ao menos um bom bocado de década que eu não ouvia Soviet Kitsch, mas ele deixou essa sexta-feira muito mais leve por reaparecer na minha vida. Spektor tem uma voz perfeita, e escreve com uma liberdade de dar inveja: coisas que parecem bobas se tornam em ótimas anedotas do dia-a-dia através da poesia dela. Ghost of Corporate Future, minha música favorita do disco e que eu simplesmente tinha esquecido até o momento que começou a tocar agora há pouco aqui na sala, me fez chorar com esse charme.
People are just people
They shouldn’t make you nervous
The world is everlasting
It’s coming and it’s going
If you don’t toss your plastic
The streets won’t be so plastic
And if you kiss somebody
Then both of you’ll get practice
A melhor (ou a única coisa boa?) em Super Mario Bros., o filme da Illumination e da Nintendo, é o Bowser, principalmente com sua vocação musical ao cantar Peaches, uma música original composta para o filme. Agora, a música tem um clipe com o próprio Jack Black, que dubla o personagem na versão americana.
O que eu lembro da minha avó é o jeito que ela repousava a sua mão pesada e dura nas minhas costas enquanto eu dormia, e me massageava gentilmente até eu acordar com a voz profunda dela entoando uma canção. Essa memória — dessa específica manhã, mas também de todas as manhãs que ela estava na casa dos meus pais durante a minha infância — é tudo o que eu tenho da minha avó, que partiu no dia do meu aniversário quando eu tinha dez anos, e que mesmo assim teve uma influência profunda em minha vida.
Até hoje, eu durmo de bruços. Mesmo depois de um médico me explicar que dormir assim é horrível para a sua coluna e para a sua respiração, e para o descanso que você supostamente deveria estar tendo. Mas eu não consigo evitar. Em algum lugar do meu cérebro, as memórias de minha avó chegam ao meu corpo quando eu vou dormir, e eu lembro dela me acordando em um dia de aula há mais de duas décadas. É tudo o que eu tenho dela.
Memórias fazem parte de nós da maneira mais íntima e misteriosa. É como aprendemos, como quantificamos nossa vida. Pode nos destruir ou nos salvar. Memórias podem mudar de forma conforme vamos vivendo. Algumas são esquecidas. Outras parecem continuar vívidas em nossas mentes. Mesmo que sejam, na verdade, apenas visuais nebulosos de um sentimento.
Essa natureza das memórias, mantidas como a mais pura expressão de nossos sentimentos, é perfeita para o cinema — que são, em essência, imagens em movimento como nossas memórias e nossos sonhos. Nos melhores filmes, essas imagens são capazes de moldar nossos sentimentos, como nossas memórias, em uma experiência quase sobrenatural. Mas filmes sobre memórias são difíceis de serem feitos, porque filmes são dirigidos, um meio “proposto” em que tudo é planejado e ensaiado e filmado. É quase impossível de capturar a qualidade fugidia das memórias.
Só no ano passado, três filmes tentaram capturar essa sensação de uma peça de memória. Dois são de grandes diretores, com Steven Spielberg examinando sua infância e seu relacionamento com seus pais no lindo e mágico Os Fabelmans; e James Gray observando as raízes profundas do seu privilégio e de seu modo de ver o mundo no desolador Armageddon Time.
Mas é Aftersun, da estreante Charlotte Wells, que usa suas memórias da infância com seu pai para fazer um filme com a mesma sensação que é se lembrar de algo assim, que captura o que é lembrar de alguém que não existe mais. Ao menos em uma forma física.
Aftersun começa com Sophie, uma mulher no início dos trinta, olhando para as fitas-cassete de uma viagem com seu pai, Calum, para a Turquia. Não é um início fácil de decodificar: nós só vemos Sophie como um reflexo numa tela de TV enquanto as fitas estão sendo rebobinadas.
É no passado que a maior parte de Aftersun se passa, quando Sophie — então uma garota de onze anos — está começando a mostrar interesse na vida adulta. Ela tem curiosidade sobre a intimidade entre os jovens que estão hospedados no mesmo hotel, e tem uma leve ideia da dificuldade financeira pela qual seu pai está passando. Mas o que Sophie não consegue enxergar direito, muito porque ela é muito nova para entender a frustração e o vazio da vida adulta e porque seu pai a protege, é o estado mental de Calum. E é isso o que Sophie adulta está tentando entender. Ela é, afinal de contas, em uma idade próxima a de seu pai, e a mãe de um bebê.
Em filmes assim, você geralmente espera por um grande momento catártico de confronto entre a criança e seus pais, que pode ou fortalecer ou destruir seu relacionamento. Mas Aftersun aborda esse relacionamento em seus próprios termos. Não há dúvida que Calum ama sua filha, nem que Sophie ama seu pai. Mas Sophie não consegue remover uma certa distância que existe entre ela e Calum. Ela é uma criança honesta e espirituosa, desejando que seu pai compartilhe com ela seus pensamentos da mesma forma que ele pede que ela o faça.
Não há um conflito em Aftersun. Suas cenas perduram, criando lentamente uma maré emocional, com planos dos restos de jantar, de paragliders no céu, ou da lama em uma piscina, pontuando o que parece ser uma narrativa banal. Calum e Sophie na piscina, ou comendo o jantar, ou falando sobre o céu. Mas Wells e seu time deixam essas imagens continuar mesmo quando uma cena normalmente terminaria, perdurando em um quarto vazio depois que eles saem, ou na piscina que eles vão mergulhar.
Parece inconsequente, até que o filme começa a acumular esses momentos e você se dá conta de que talvez essas sejam as últimas memórias de Sophie com seu pai, e você começa a entender porque ela — que não está mais somente assistindo vídeos daquele lugar, mas lembrando de coisas que nunca foram filmadas — se mantém nesses detalhes, procurando por pistas que seu pai talvez tenha deixado: um cartão postal que ele deixou, as marcas no espelho, o modo como ele olha para ela enquanto ela canta um parabéns…
Essas pistas começam a se acumular como uma foto sendo revelada aos poucos, até tomar forma, e Aftersun representa essa busca de sua protagonista por compreender seu pai de uma maneira mais metafórica, no que parece ser uma festa. Esses momentos que ela e seu pai compartilharam começam a ficar nebulosos; seus detalhes, escassos. Ao mesmo tempo, nós queremos que eles fiquem juntos, que não desperdicem um segundo sequer. Nós sabemos que eles vão, que eles não conseguirão. É assombrador, porque é real.
O que Aftersun tem de clímax não é um confronto, nem uma culminação. Como suas cenas parecem formar uma maré levantando, subitamente as suas ondas começam a quebrar. Como o mar, as memórias podem nos enganar. Nós nem sempre conseguimos prever como uma onda vai nos alcançar, com qual tamanho ou com qual força, até que seja tarde demais, nos cobrindo de água. Quando Sophie lembra de uma dança, e que ela consegue se conectar com como o seu pai estava se sentindo, parece quase um afogamento. E, em uma escolha de música e montagem brilhante, tanto a trilha-sonora quanto a imagem parecem retratar a angústia de perder seu fôlego por um momento. A Sophie de hoje encontra o Calum de suas memórias no momento em que a Sophie do passado perde seu pai para sempre.
Isso é tudo o que ela tem dele. Não o tapete que ele comprou, ou a câmera que ele usou, mas suas memórias. E elas são incertas, nebulosas. Mas isso é tudo o que existe dele para Sophie. Parece ser perdido no mar no meio da noite, não sabendo onde começa o mar e termina o céu. Você perde sua direção, sua respiração. Você não sabe se seus pés vão tocar o solo de novo.
E então, ela é resgatada pelo barulho gentil do presente. Ele vai continuar na sua cabeça, em suas memórias e em seus sentimentos, guiando suas escolhas das formas mais misteriosas. Desconhecido e eterno. Ela vai tentar capturar ele em tudo o que fizer. E, se tiver sorte, vai conseguir traduzir pelo menos um pouquinho do que foi existir ao lado dele por um momento. Eu sei que eu tentei.
Tears of the Kingdom, a continuação de The Legend of Zelda: Breath of the Wild, está logo aí. É o meu jogo mais esperado do ano. Parece fantástico. Eu passo horas do meu dia lendo teorias da conspiração sobre o jogo, que a gente sabe tão pouco mesmo estando há poucos meses de seu lançamento. Eu passo as noites sonhando em tirar umas férias bem longas e me aventurar em Hyrule de novo.
É um sentimento que me remete à infância. Quando eu era pequeno, eu esperava pelos novos livros do Harry Potter, que vinham no final do ano. Eu esperava lendo revistas sobre e revendo os filmes, e brincava com meus colegas da escola no recreio, fingindo que os corredores da nossa escola eram os corredores de uma escola de bruxos como as dos livros. A expectativa pelo lançamento de um novo livro da série era cheio de atividades, a maioria dentro das nossas cabeças.
Lil Gator Game remete à essa época de imaginação fértil em um jogo sobre um grupo de amigos brincando de aventura na ilha em que eles moram, imaginando que pedaços de papelão são monstros que precisam ser derrotados, que pessoas oferecem missões. O jacarézinho e seus amigos estão esperando pelo novo Legend of Hero, que parece ser incrível, e enquanto eles esperam pelo lançamento do jogo, eles criam a sua própria brincadeira para matar o tempo.
Do mesmo criador do incrível A Short Hike, Lil Gator Game não é um jogo de aventura como Zelda, mas é uma carta de amor à franquia da Nintendo. Não só pelas referências (no início do jogo, os amigos precisam encontrar uma “espada”, um “escudo” e um chapéu, já que o jacaré já é verde, para continuar a brincar), mas pela estrutura. Lil Gator Game começa bem simples e, dado o tamanho da criação anterior do estúdio, você se engana que o escopo será pequeno também. Mas então ele oferece uma experiência semelhante a Breath of the Wild, e se abre para o jogador. A estrutura é muito mais simples: você encontra seus amigos, você brinca, e finge que está em uma aventura.
Por incrível que pareça, Lil Gator Game consegue capturar a mágica de Zelda, de que você está em um mundo labiríntico, misterioso e fascinante, não repetindo a fórmula, mas por mostrar o carinho desses personagens pelo mundo fantasioso. A empolgação em “brincar como” deles é contagiante que Lil Gator Game te coloca na brincadeira também. Você não vai solucionar quebra-cabeças para liberar novos itens aqui, mas você vai acompanhar uma criança aprendendo que o tempo que ela tem para imaginar mundos vai passar, e que é precioso enquanto ela pode fazer isso.
É estranho, mas eu tenho uma pequena coleção de discos de vinil que foi crescendo sem eu perceber. Eu moro perto de uma feira de antiquários que acontece no sábado de manhã, e nesse último ano eu encontrava discos incríveis, como o Alucinação do Belchior e o Little Creatures do Talking Heads por R$ 30 (o mais caro, a trilha-sonora do Blade Runner pelo Vangelis, foi R$ 75).
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Eu posso não ter percebido, mas meus pais perceberam. Eu levava esses discos para a casa deles nos fins de semana para ouvir no toca-discos que eles têm. Nesse Natal, eu ganhei um toca-discos para mim, e eu tô impressionado em como ele mudou drasticamente a minha relação com a música de um jeito tão rápido.
Aconteceu o seguinte: fora determinadas circunstâncias, como quando eu apresento uma música para alguém, eu escuto música fazendo outras coisas. Eu ouvi Cool It Down, meu álbum favorito do ano passado, enquanto corria. Até mesmo Random Access Memories, o álbum que eu lembro de ter feito um lembrete no calendário para marcar o lançamento, eu escutei enquanto “trabalhava” (ênfase para as aspas).
Minha relação com a música, geralmente, é na forma de trilha-sonora. É o que está nos meus ouvidos enquanto eu trabalho, ou faxino a casa, ou no ônibus para visitar meus pais. Diferente de ir ao cinema ou esperar o novo episódio de uma série no domingo de noite, eu raramente reservava meu tempo para ouvir música. Talvez seja por isso que eu tenha tanta dificuldade para comentar sobre música com meus amigos, e que minha relação com meus discos favoritos geralmente seja baseada em memórias que tenho ao ouvi-los*.
Enfim… voltando ao assunto. Com o toca-discos, eu comecei a reservar um momento para sentar ao redor dele e colocar um disco para tocar. Como parar para ler, eu paro para ouvir um disco. Eu não vou ficar aqui argumentando sobre a qualidade do som nem coisas assim. Eu não entendo o suficiente disso para ser contra ou a favor. Mas existe algo no fato de que você precisa colocar um disco, ajustar a agulha, e prestar atenção na música para trocar o lado, que me faz me relacionar com o ato de ouvir a música de um jeito diferente.
E então eu lembro que, quando eu era criança, meus pais faziam isso com a gente. Geralmente nas sextas-feiras, meus pais colocavam a coleção (consideravelmente maior) de vinil deles para tocar, no pequeno quartinho que a gente chamava de escritório, enquanto eles tomavam vinho ou cerveja. Eu e minha irmã ficávamos em volta, mas nem sempre dávamos muita bola (era impossível não ouvir, já que eles colocavam o som muito alto) para as histórias que eles contavam quando ouviam as músicas. Mas eles estavam ali, prestando atenção nas faixas que eles escolheram levar pra vida deles através daquela coleção. As vezes nem eram memórias, e sim sentimentos específicos. As vezes vinham os amigos, mas as vezes eram só os dois. Uma espécie de listening party.
Em 2020, no início da pandemia, eu escrevi um pouco sobre a minha relação com música. Ano passado, eu encontrei um backup de músicas que eu ouvia na adolescência. Então essa mudança que ocorreu com o toca-discos pode ser parte desse processo de reavaliar a música na minha vida. Tá sendo um processo muito bacana, em que eu tenho realizações tardias sobre coisas que todo o mundo já sabia, por exemplo:
Alucinação é um disco perfeito.
(*) Acho que não comentei aqui, mas ano passado eu fui visitar a Manu em Curitiba, e no trajeto de volta, em que ela me levava no aeroporto, colocamos The Suburbs para tocar. Foi um momento perfeito, em que o disco durou exatamente o tempo da viagem, enquanto a gente olhava para os subúrbios e nos despedíamos.