É muito difícil de falar de Betty porque é uma série muito longe da minha “existência”. É sobre um grupo de jovens mulheres skatistas em Nova York, e como elas passam seus dias e criam uma comunidade entre si. Mas o que Betty me faz sentir é algo muito poderoso, e eu acho que é algo proposital, que me coloca perto dessas personagens emocionalmente.
Em seus episódios, as jovens de Betty aparecem fazendo manobras em seus skates pelas ruas de Nova York, e tem algo de libertador ao assistir elas fazendo isso: elas usam um corrimão ou um meio fio como obstáculos; uma escadinha ou um cachorro dormindo na rua são oportunidades perfeitas para experimentar uma manobra nova. Existe um “fluxo” quando elas andam de skate, uma mistura de técnica e improviso, de aproveitar o exato momento em que algo aconteceu. É uma união do mundano e do extraordinário.
O que torna Betty especial é justamente enxergar toda a existência de suas personagens com essa magia. Em seus episódios de meia-hora, a série segue suas personagens – as vezes juntas, as vezes sozinhas – em suas jornadas do dia-a-dia, seja no trabalho ou no ócio daquele momento na vida em que a gente não sabe muito bem o que vai fazer dela.
Betty não cria uma “propulsão narrativa” para suas personagens, os episódios são muito simples: em um, Gabrielle precisa encontrar a mochila que esqueceu no parque; em outro, Honeybear quer puxar assunto com uma garota que ela viu na rua e se apaixonou. É na forma como essas garotas encontram as oportunidades ao redor que a série se torna emocionante; seja Gabrielle fazendo uma amizade com Janay enquanto elas procuram a mochila, ou Honeybear descobrindo um pouco da sua sexualidade em meio a um flerte. Com o passar dos episódios, elas vão encontrando pequenos momentos, alguns elas aproveitam e alguns não, e você nunca sabe quais serão esses que elas vão aproveitar ou no que vai dar.
No episódio mais recente da segunda temporada, que tá passando na HBO nas sextas à noite, as garotas estão um pouco sem chão. Com a pandemia, elas não podem vagar pela cidade como podiam antes, e o lugar que elas usavam para treinar foi fechado. Cada uma está um pouco perdida em suas próprias vidas, em como procurar um trabalho ou com o que fazer com seus dias. Mas quando elas encontram um lugar para treinar, é como se tudo se resolvesse. Elas andam e brincam e conversam em seu novo lugar. Suas jornadas não se resolveram de fato – alguns problemas continuam, e alguns provavelmente não vão acabar tão cedo –, mas elas pararam para aproveitar a beleza daqueles momentos juntas, um momento tão mundano e tão extraordinário ao mesmo tempo. Betty é especial porque consegue enxergar essa beleza o tempo todo, seja nas rampas de skate ou em momentos simples e inesperados como esse. É uma série mágica, que me faz me sentir flutuando em sentimentos.