The Night Of começa com uma sequência de títulos bem clássica. Faz tempos que a HBO começou a apostar em grandes aberturas pras suas séries de drama, contrariando a onda de títulos curtos que outras emissoras vinham fazendo. Ela não é mais bonita, por exemplo, como as duas aberturas de True Detective. A gente compara com True Detective naturalmente, aliás. Essa minissérie (embora ja se fale em segunda temporada) veio, muito discretamente, ocupar o espaço que seria da terceira temporada da antologia de crimes escrita pelo Nick Pizzolatto.
Adivinha: ela faz muito mais que isso.
Eu nunca vi a segunda temporada de True Detective. Todo o mundo que viu me disse que ela era horrível (eu não faço hate watch, então evitei ver). Eu já achava a primeira temporada, embora muito bonita e bem dirigida e bem atuada, cheia dos problemas narrativos (sério, aquele pessimismo e machismo era bastante chato), então provavelmente nunca vá me ouvir falar que aquela sequência na cena do crime do episódio oito é a melhor coisa que já se fez na TV. Eu não acho. Mas a HBO exibiu o primeiro episódio de The Night Of e, eu preciso dizer, que essa já tem a chance de ser a melhor série do ano.
The Night Of possui oito episódios e se começa na noite em que Naz, um descendente de paquistaneses na Nova York de 2014, pega o táxi emprestado do pai para ir para uma festa, quando acaba dando carona para uma mulher que aparece no táxi. Eles passam a noite juntos, transam, usam drogas. Ele acorda, horas depois, e ela foi brutalmente assassinada. Naz foge do local, e assim ele se transforma no principal suspeito.
Isso é uma parte do primeiro, e irretocável, episódio de The Night Of. Se desenvolvendo de forma devagar, como um bom romance policial, a série não se apressa em revelar detalhes ou em exibir grandes cenas de ação. Pelo contrário. Boa parte de “The Beach”, o piloto, trata da vida de Naz, como ele é tratado nos Estados Unidos que ele nasceu mas que não se sente parte, cheio de disparidades raciais, étnicas e de classes. A Manhattan de The Night Of é hostil e sombria. As vezes até selvagem. Ela lembra um pouco The Wire. Parece que você pode respirar o vento da noite.
Essa é uma das séries mais bonitas da TV.
E The Night Of é mais comparável a The Wire que True Detective justamente pela maturidade que ele apresenta. Olha como a série usa o suspense e a tensão muito mais pra mostrar seus personagens presos em sistemas que os forçam a fazer escolhas questionáveis, ao invés de ir pro lado do suspense de impacto, da surpresa. Com o decorrer do primeiro episódio, Naz vai desaparecendo atrás de um pesado sistema judicial, ficando preso naquilo que fala. Caralho, ele vai se ferrar feio.
O interesse de The Night Of pelo processo judicial (assim como The Wire, na sua primeira temporada, tinha pelo processo de investigação) é meticuloso, e isso é o que parece dar o ritmo da história. Poucas séries, inclusive da HBO, parecem tão interessadas em gastar o seu tempo nos detalhes: os processos judiciais são exibidos em detalhe, sem nunca se tornarem maçantes, e cada personagem possui muito tempo de exploração e apresentação. Quando Naz faz as escolhas erradas que ele faz, a gente não só sabe como ele vai se ferrar por isso, mas a gente entende o sentimento que o impulsionou a fazer o que fez.
No seu núcleo, The Night Of ainda é um suspense sobre quem cometeu o crime (o chamado whodunnit). Mas ele é tão interessado em quem cometeu o crime quanto as pessoas envolvidas por toda a investigação. Seja o Naz, o advogado John, os policiais Box, Klein, Chandra, e até mesmo os outros suspeitos. Cada um desses personagens possui uma vida fora desse caso policial, e é interessantíssimo como ele joga com isso no primeiro episódio (e vai ser ainda mais interessante ver o que vai ser feito após). Embora boa parte das vidas dos acusados e dos advogados parem de acordo com o caso, muito de suas crises pessoais, seus problemas físicos ou sua aparência dependem daquilo que estão vivendo.
The Night Of começa com um episódio impecável, o melhor que a TV exibiu durante todo esse ano. Com um começo tão brilhante assim, vai ser difícil a série continuar no ritmo. Mas isso vai ser empolgante: se The Night Of continuar desse jeito, ela já tem um lugar na história dos grandes seriados policiais da história. Esse neo-noir tem um dos melhores elencos da televisão, uma realização que só a HBO consegue produzir, e uma história envolvente, importante e instigante. Eu tive que parar um pouco após terminar “The Beach”. Isso é televisão perfeita.