Velouria te põe na pele de um músico no palco — mas o seu rival também está nele!

Se você já estudou ou tentou tocar música por si próprio, sabe que todo o processo de aprender os instrumentos, as estruturas de uma composição (tanto enquanto melodia quanto poesia), as técnicas de improvisação: tudo isso é complicado e exige tempo e dedicação. Isso sem contar o medo do palco, da reação muitas vezes imprevisível do público. De vez em quando, nós só queremos fazer um air guitar, fingir que nós podemos ser grandes astros dos palcos. E se você tiver ao menos um amigo com essa mesma vontade, eu tenho um jogo pra te recomendar!

A vila inteira estava reunida para a festa do solstício de inverno. Minto. Apenas um trio de bêbados e meia dúzia de adolescentes entediados perambulavam em frente ao palco. Subi no tablado pela direita e Magnus, meu amigo, mas também meu maior rival, subiu pelo outro lado. Só uma pessoa realmente prestava atenção à cena: nosso professor de alaúde.

— Trecho de Velouria: Batalha de Bardos

Velouria: Batalha de Bardos é um jogo narrativo escrito por Gabriel Kerr com o objetivo de dar a você a chance de se colocar no lugar de um bardo nos palcos da cidade fantástica de Velouria. Aqui, não existem perigos, monstros, justas, tiranos ou guerras. Mas isso não significa que a população de Velouria não gosta de competição, do nosso velho pão e circo: eles só encontraram outra forma de resolver suas disputas por glória!

Talvez você espere encontrar grandes perigos para derrotar, conspirações para revelar, guerras para vencer. Recomendo então que procure o reino ao lado. Nós somos um povo simples, de gosto simples e nossa terra não parece ter valor suficiente para os gananciosos.

Isso não significa que não gostemos de disputas! Estamos sempre organizando festas e concursos onde mostramos nossas melhores habilidades. Mas nenhuma disputa, nenhum concurso, seja de escultores de gelo ou domadores de grifo, é tão grande como o Duelo de Bardos no Palácio de Brine, no Dia da Renovação. Todo ano os maiores artistas de toda Velouria competem para descobrir quem é o maior de todos!

Quem sabe um dia você pode ser sete vezes campeão como o maior de todos os tempos, Honorius Praite?

— Trecho de Velouria: Batalha de Bardos


Uma artista branca com poderes mágicos, dançando de olhos fechados “Artista Performática Radiante”, por Alessandra Pisano

Inventando um artista fictício

Mas como esse jogo funciona? Bom, como em outros jogos narrativos analógicos, você vai criar uma personagem para encarnar: o seu Bardo, que vai protagonizar a narrativa! Você também vai precisar de ao menos um outro jogador, que agirá como a Platéia, e de pelo menos um dado de 20 lados. O dado vai servir para representar a sorte e o acaso na história que vocês vão contar juntos — nem sempre as performances musicais dão certo, afinal.

Para que o dado seja usado, seu Bardo precisa ser criado sob quatro critérios principais:

  • Ele vai ter um Chamado sobre como aprendeu música, talvez seja um autodidata, ou quem sabe um acadêmico.
  • Ele vai ter uma Musa, um elemento da realidade que o inspira para tocar, talvez o amor, ou o trabalho.
  • Ele vai ter Técnica, Improvisação, Poesia e Repertório, atributos com valores numéricos que definem como você vai rolar os dados durante suas apresentações.
  • Ele vai ter um número de obras em seu Repertório, uma combinação de Substantivo e Adjetivo que formam um estilo artístico misturado com um gênero lírico — por exemplo, uma Ária Religiosa, ou quem sabe um Canto de Ninar.

Uma das coisas mais legais da criação do seu bardo é o elemento de titulação: quando você cria as obras do repertório, você é quem põe títulos nelas! Tem um certo prazer simples em inventar títulos para obras que não necessariamente existem na realidade. Qualquer pessoa que já jogou The Sims como um escritor sabe do que eu estou falando!

Com um Bardo criado e suas obras reunidas, o próximo passo é subir no palco. Mas, para o bem ou para o mal, você não vai estar nele sozinho…

Um maestro negro com poderes mágicos, comandando uma orquestra no meio de uma tempestade “Zaffai, Maestro do Trovão”, por Dmitry Burmak

Duelando e aprimorando-se

Velouria não é só sobre ser um músico: é sobre Batalhas de Bardos. O momento principal do jogo é a batalha em si, momento em que seu Bardo e um rival ou adversário se enfrentam no palco, disputando quem tem a pontuação mais alta.

O duelo é mecanicamente interessante de várias formas:

  • A Plateia escolhe secretamente que obras do Bardo ela gosta mais antes da apresentação começar, e essas rendem mais pontos;
  • O Bardo decide qual é a dificuldade da própria rolagem que vai fazer;
  • Determinados momentos da apresentação, como a abertura e o encerramento, garantem mais pontos.

A combinação das mecânicas do duelo criam cenas em que Bardos precisam escolher entre confiar no público com seu material ou tomar riscos, que podem ser tudo ou nada para a vitória do duelo. Além disso, a variação de reação da plateia, combinada com a interpretação das obras que foram inventadas na criação de personagem, cria uma sensação de exposição: você, como artista, vai apresentar um título que você mesmo bolou, e o público pode não gostar dele. É o frio na barriga traduzido em mecânica.

Ganhando ou perdendo os duelos, você acumula pontos de cancha, que pode usar para melhorar seus atributos ou escrever novas obras. Nada disso acontece instantaneamente: você só gasta pontos de cancha se nos contar sobre o processo de criação do seu artista, incluindo o tempo de incubação de suas ideias!


A performance não é monolítica

O texto de Velouria fecha com um bônus: o jogo oferece diversas reinterpretações breves de suas mecânicas, para exemplificar que tipo de jogo poderia facilmente acontecer sobre suas bases estabelecidas. Entre os exemplos, temos elementos previstos, como as Batalhas de Rap, mas também exceções interessantes, como a ginástica olímpica e o Reality Show de culinária — esse último, tornado realidade por Leonardo Andrade em Chef Showdown.

Da forma como se apresenta para nós, Velouria é um mecanismo simples e eficiente para contar histórias sobre Batalhas de Bardos, mas também um comentário lúdico sobre performance, arte e público. Ele nos convida a imaginar uma mente criativa fora da nossa, que tem outras inspirações e cria obras de outra natureza — ou, talvez tão interessante ou mais, ele nos convida também a tentar nos recriar em suas mecânicas, de forma a ver a reflexão que criamos e observar nossos próprios métodos e inspirações.

Independente dos significados mais profundos que possamos inferir, a verdade é que às vezes precisamos de histórias onde nosso maior problema é tentar rimar com “laranja”.


Você pode adquirir uma cópia de Velouria na página do autor no itch.io, e também na plataforma nacional dungeonist.