Eu julgo livros pela capa. Desculpa, mãe, mas é verdade. Eu evito, por exemplo, de comprar livros com as capas dos filmes inspirados neles. Quando eu não estou lendo meus livros, eles ficam na minha estante — e as capas deles deixam ela mais bonita.
Eu digo isso porque Iniciantes possui uma daquelas capas que, além de serem lindas, resumem o meu sentimento quanto ao livro. Uma coletânea de contos de um dos mestres modernos que consegue capturar um instante na vida de seus personagens que, como aquele momento registrado na capa, parece registrado para a eternidade.
Iniciantes é uma coletânea de contos do Raymond Carver. Se você assistiu o vencedor do Oscar de melhor filme do ano passado, Birdman ou (A Inesperada Virtude da Ignorância), deve lembrar: ele é o autor do conto que o personagem Michael Keaton quer desesperadamente transformar em uma peça. Carver é um dos mestres do conto moderno americano, as vezes chamado de “mestre do minimalismo”, uma vez que seus contos possuem pouquíssimas descrições e são referência no dinamismo e na prosa concisa e direta. Carver é, porém, um gênio no que se refere a concepção de diálogos humanos e na percepção de comportamento de seus personagens. Não existe, nesse Iniciantes, um conto menor.
Não há muito minimalismo em Iniciantes. Aqui você pode conferir as versões integrais da primeira coletânea de contos do autor (What we talk about when we talk about love), antes das alterações e cortes de seu editor na época. Em Iniciantes, Carver é visto sem resumos, e seus contos brilham pela sua simplicidade narrativa, pela sua linguagem direta e pela sua clareza. Mais que isso, porém. Em Iniciantes, Carver nos dá momentos para viver.
É por isso que eu comecei esse post comentando a capa. Se a foto que abre o livro é um retrato instantâneo de um momento qualquer, é exatamente essa a impressão que fica quando estamos lendo os contos ali dentro. Desde o incrível conto de abertura, “Porque não dançam”, até o “Mais uma coisa”, que encerra, passando pelos geniais “Uma coisinha boa”, “Coreto”, “Torta” e os amedrontadores “Diga às mulheres que a gente já vai”, “É meu” e “Tanta água tão perto de casa”. Os contos em Iniciantes diferem de tamanho e as vezes do modo de prosa (algumas vezes em primeira pessoa, outras vezes em terceira), mas a impressão é a mesma: estamos ouvindo um momento da história de outras pessoas, aquele exato instante que essas pessoas percebem que não são mais especiais, ou aguardadas em um grande destino, como o sonho americano as fez acreditar. Elas são pessoas ordinárias, as vezes medíocres, que esperaram a vida toda por algo acontecer. E, quando perceberam, já havia acontecido.
Iniciantes narra suas histórias com vigor, mas sempre com uma maneira delicada de enxergar sua época e lugar. E essa é a beleza da narrativa de Carver. Nos fazer perceber que, talvez, somos tão estranhos, nojentos ou medíocres quanto os protagonistas do autor.